Jornal defensor da valorização de Aveiro e da Região das Beiras
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Adriano Lucas (1925-2011)
Diretor: 
Adriano Callé Lucas

“Este ano, mais do que nunca, queríamos celebrar o 25 de Abril”


Sexta, 24 de Abril de 2020


O Teatro Viriato dá hoje início a uma programação especial com o objectivo de “recuperar a memória de 1974”. Hoje, no SubPalco, às 10h00 e às 22h55, será dado início à ‘Revolução na Montanha’. Amanhã, às 8h00 e ao longo de 12 horas, o Teatro do Vestido avança pelas ruas de Lisboa, com a estreia da performance ‘E naquele dia saímos para uma cidade lavada e livre’. Às 10h00 tem início a palestra ‘Português Entrecortado’. No domingo, haverá ‘Consultório Revolucionário’, das 15h00 às 17h00, e das 18h00 às 20h00. O Diário de Viseu falou com Patrícia Portela, directora artística do Teatro Viriato


Como é que surgiu a ideia para esta programação especial e o envolvimento do Teatro do Vestido?
O Teatro Viriato fechou as suas portas físicas a 12 de Março, mas nunca deixou de programar e de se manter ligado aos artistas, ao seu público e à comunidade que serve e que por ela é apoiado. Desde logo estreámos projectos concebidos em Viseu mas também um pouco pelo mundo todo, como foi o caso do ‘Consultório Turístico’, via telefone, pela rádio, no site e nas nossas redes sociais, procurando manter todos aqueles que habitam um teatro juntos e em diálogo, e isso implica o artista residente, associado ou convidado, o público, os parceiros, os apoiantes e todos os que colaboram connosco, do segurança ao técnico-mor. Este ano, mais do que nunca, queríamos celebrar o 25 de Abril, pareceu-nos importante sair à rua sem sair à rua. A vontade foi essa, foi simples. O resto é a magia dos encontros a funcionar. Convidámos aqueles que queríamos connosco e propusemos um ‘Consultório Revolucionário’. Todos nos trocaram as voltas, porque a criação é um bicho que não pára quieto e não se restringe a um formato. Uns propuseram poesia, outros uma performance. E assim cresceu mais um projecto que é de todos nós, como o são todos.

Quando é que foi feito o convite ao Teatro do Vestido? Quanto tempo demorou a criar a performance?
Não me lembro bem. Este é um período estranho, nenhum de nós tem bem a noção do tempo por estes dias, mas o convite não pode ter sido feito há mais de um mês, pois há dez dias o mundo ainda era um lugar diferente, um lugar entre lugares que, a cada dia que passa, vão ficando mais claros. O mais curioso é que, como lhe disse, a proposta feita à Joana Craveiro foi a de fazer um Consultório, mas em conversa telefónica nasceu uma performance da inteira autoria do Teatro do Vestido. E não há maior felicidade do que esta: a de ver nascer um projecto à nossa frente que, não tenho dúvidas, será um momento histórico e um objecto artístico de raro valor.
 
Seria possível fazer uma performance que percorre as ruas de Lisboa se não fosse a pandemia?
Claro que sim! Aliás, deveríamos dizer o contrário, montar esta performance numa época como esta é uma loucura e só mesmo a convicção e a vontade de o fazer o permitem. São inúmeras as necessidade de segurança e higiene, são inúmeras as dificuldades de produção para manter uma performer sozinha na rua durante 12 horas e o rigor técnico exige-nos a maior das atenções quando estamos todos a trabalhar à distância. Temos duas equipas inteiras de Produção e Comunicação de uma companhia de Teatro e de um Teatro a trabalhar à distância como se fôssemos a base de Houston a aterrar o seu primeiro foguetão na superfície da Avenida da Liberdade lunar e a colocar, pela primeira vez, uma performer a celebrar a liberdade no centro de uma Lisboa em tempos de pandemia.

O que é o SubPalco? Como é que será aproveitado nos próximos tempos?
Temos de imaginar que o Teatro Viriato sofreu remodelações durante esta quarentena e ao invés de fechar, abriu novas salas, nem todas elas físicas, mas todas elas com um palco que permite o encontro e a troca artística em presença e em tempo real com os espectadores. O SubPalco é um desses novos palcos do Teatro Viriato, onde se podem transmitir por exemplo, já neste sábado, a revolução de Joana Craveiro, mas também outras propostas que forem surgindo e façam sentido dentro da nossa lógica de programação remota, ou seja, da nossa programação realizada em proximidade com todos, mas respeitando a distância física. A este palco juntam-se o nosso palco telefónico, como acontece nos Consultórios, a correspondência por SMS ou carta em projectos a estrear em breve, entre outros formatos que, por certo, surgirão. Dentro da lógica que nos acompanha desde o minuto 1 quando afirmámos ‘Se a montanha não pode ir ao teatro, deslocar-se à o teatro à montanha’, o nosso objectivo é continuar próximo dos nossos artistas e do nosso público, cumprindo aquela que é sempre a nossa missão – juntar ambos e proporcionar um espaço de criação para uns e de fruição para outros.

Comemorar o 25 de Abril tem um significado especial neste tempo de pandemia?
Claro que sim. Comemorar o 25 de Abril tem sempre um significado especial para todos nós, se somos portugueses e se acreditamos na liberdade. Esta é uma das revoluções mais especiais em toda a história recente da Europa. Se juntarmos a isso o facto de não podermos sair à rua este ano, mais pertinente me parece celebrar este dia, para que não nos esqueçamos que apesar de fechados em casa, somos livres, e se o somos, é porque há 46 anos, à revolta militar dos Capitães de Abril juntou-se a revolta popular, e todos juntos, nas ruas, mudámos o país e o mundo que, como sabe, correu para Portugal nessa altura para ver a revolução acontecer.

O que pode a comunidade esperar desta programação e quais são as expectativas do Teatro Viriato?
O que queremos é celebrar a revolução e a liberdade em conjunto. Se a comunidade se juntar a nós, assistindo às comunicações poéticas via telefone, partilhando as declarações muito especiais de Aldina Duarte e Jorge Silva Melo; acompanhando os directos do Teatro do Vestido ao longo do seu percurso da revolução, seja no nosso SubPalco, seja pelo Instagram ou seja espreitando pela janela, vendo-a passar; ou terminando no futuro na companhia de Jorge Andrade a 26 de Abril, teremos tido a festa mais bonita de sempre, e temo, poderá bem ser uma que não nos esqueceremos jamais! |


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