Jornal defensor da valorização de Aveiro e da Região das Beiras
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A cultura reinventa-se e salta de casa para a internet. É o que é possível


Segunda, 13 de Abril de 2020

Os 250 anos do nascimento de Beethoven seriam assinalados com o nível que o mestre da música clássica merece. Mas não foi possível, pelo menos da forma que a Orquestra Clássica do Centro (OCC) tinha previsto, com um mês de Março repleto de iniciativas que foram canceladas. A data, contudo, não passou em branco e a OCC uniu os seu músicos e, à distância como a Covid-19 impõe, fez o que foi possível para homenagear o compositor através das redes sociais. «Cada um em sua casa a fazer o que é quase um milagre», explicou Emília Martins, directora da OCC.
Do Pavilhão Centro de Portugal, sede da OCC, saltamos – imaginariamente porque tudo está fechado – para o Fado ao Centro - Casa de Fado. Aqui, a música é outra – é fado – mas a situação é igual. Cancelamento de muitos espectáculos, adiamento quando se consegue de tantos outros, com o fado a continuar presente mas apenas na internet, produzido, tal como fizeram os músicos da OCC, a partir de casa. Na página de Facebook Fado ao Centro, numa das últimas iniciativas do grupo, está a interpretação da “Balada do 5.º ano jurídico de 1988”, nem de propósito com a mensagem que todos esperam ouvir quanto antes: “Sentes que um tempo acabou”. Deste que se vive, contudo, não ficará saudade.
Os palcos estão fechados, as plateias estão vazias, a cultura saltou para a internet, mas isso não dá sobrevivência aos artistas, apenas mantém viva a chama da arte em que cada um é especialista. É assim desde que a pandemia tomou conta das vidas.
«A nossa casa está fechada, não há ensaios, cancelámos concertos, as pessoas, espontaneamente, vão fazendo coisas em todo o mundo», desabafou Emília Martins, admitindo a sua «apreensão» e «preocupação» com o presente e futuro da OCC, que conta com 36 colaboradores, entre músicos, maestro e outros funcionários. «Felizmente contamos com o apoio da DGArtes, mas muita da nossa actividade é financiada por concertos», diz ainda, frisando com o sector da artes já vive um dia-a-dia com muita «precaridade» que «com esta crise assusta ainda mais».
O Teatrão, que ocupa a Oficina Municipal de Teatro, também vive graças ao financiamento da DGArtes e do município de Coimbra, mas também Isabel Craveiro destaca como é «débil» o sector da cultura em Portugal. «Fazemos um esforço muito grande», reconhece a directora do Teatrão, acentuando como actualmen­te é «angustiante ver a relação com o público abruptamente cortada».
O trabalho do Teatrão é agora feito em casa, na casa de cada um. Isabel Craveiro, por exemplo, trabalha a partir da Covilhã. «Cancelámos a actividade programada até final da temporada», explica, confiante, ainda assim, que vai ser possível reagendar alguma actividade que estava prevista ainda que tudo seja ainda uma «indefinição». Por agora centram--se atenções no projecto que a companhia estava a desenvolver no Vale da Arregaça e que, ironicamente tendo em conta o panorama actual, é marcadamente «comunitário», envolvendo a participação de muitas pessoas, entre actores e outros participantes que se juntaram ao projecto. «Iria estrear em Julho, adiámos para Setembro. Estamos numa fase capital do processo, com a primeira versão do texto já pronta a ser trabalhada, vamos tentar o ensaio de leitura online, cada um na sua casa, é a primeira vez que o vamos fazer», conta Isabel Craveiro. «Temos de reinventar e testar novas maneiras de trabalhar», diz ainda, garantindo que o Teatrão não está parado, mas «adaptado».
No Fado ao Centro a realidade é outra porque aqui não há apoios, mas apenas trabalho e o fruto que dele se consegue. «Fomos duplamente afectados», informa João Farinha, recordando que o grupo teve de cancelar a digressão prevista por diversos países, desde Alemanha ao Canadá, passando pela Argélia e tantos outros, mas também - e aqui reside a «perda mais grave» - a quebra de receita provocada pelo obrigatório encerramento da casa de fados no Quebra Costas que se prepararia agora para a melhor altura do turismo. «Sou optimista por natureza, acho que vai passar», desabafa. Enquanto não passa, o fado de Coimbra entra em casa pela internet e vindo da casa de cada um dos membros do grupo. 


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