
Falta de literacia e centros de referência atrasam diagnóstico de doenças raras
Diário de Aveiro: De acordo com o Serviço Nacional de Saúde (SNS), estima-se que existam entre cinco e oito mil doenças raras diferentes, afetando, no seu conjunto, até seis por cento da população, o que significa que existirão até 600 mil pessoas com estas patologias em Portugal. Como descreve o atual panorama nacional?
João Ferreira: O atual panorama nacional das doenças raras reflete um cenário de avanços significativos, mas também de desafios persistentes... A existência de até 600 mil pessoas com doenças raras em Portugal demonstra que, embora cada uma destas patologias tenha uma prevalência reduzida, o impacto global na população é expressivo. Estes doentes enfrentam dificuldades que vão desde a obtenção de um diagnóstico correto até ao acesso a tratamentos e cuidados especializados. A título de curiosidade, as doenças raras mais comuns em Portugal são a Polineuropatia Amiloidótica Familiar, mais vulgarmente conhecida como “doença dos pezinhos”, a doença de Fabry e a doença renal poliquística autossómica dominante, entre outras. Nos últimos anos, Portugal tem dado passos importantes no reconhecimento e na abordagem das doenças raras, nomeadamente através da criação de centros de referência e da adesão às Redes Europeias de Referência, que facilitam a partilha de conhecimento entre especialistas, em diversas áreas e de diferentes países. No entanto, o diagnóstico continua a ser um processo demorado, muitas vezes exigindo anos de consultas, exames e tentativas frustradas de tratamento antes de se chegar a uma conclusão definitiva.
Outro fator crítico é o acesso a terapias inovadoras, que frequentemente são de custo elevado e não estão imediatamente disponíveis no Serviço Nacional de Saúde (um excelente exemplo é a reivindicação por parte da Associação Nacional de Fibrose Quística e Associação Portuguesa de Fibrose Quística, que lutam pelo acesso dos pacientes portugueses às terapias inovadoras, aprovadas pela Agência Europeia do Medicamento). Muitas destas doenças exigem tratamentos personalizados, o que torna a sua investigação dispendiosa e demorada. A falta de formação específica entre os vários profissionais de saúde também contribui para que muitos casos sejam subdiagnosticados ou confundidos com outras condições mais comuns. Além disso, a componente social das doenças raras não pode ser ignorada. O isolamento, a discriminação e a falta de apoios adequados para as famílias são problemas recorrentes. Creio que a implementação de políticas públicas mais robustas, o incentivo à investigação e o aumento da consciencialização sobre estas patologias são fundamentais para melhorar a qualidade de vida dos doentes raros em Portugal.
São consideradas raras as doenças crónicas, graves e degenerativas que colocam em risco a vida dos doentes. Que prevalência deve ter uma doença para ser considerada rara?
A prevalência que uma doença deve ter para ser considerada rara é de menos de um caso por cada duas mil pessoas, segundo a definição da União Europeia. Embora este critério numérico sirva como referência, a realidade das doenças raras vai muito além dos números, uma vez que a maioria destas condições tem um impacto desproporcional na vida dos doentes e das suas famílias.
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