A revolução dos hábitos no olfacto e papilas gustativas
É uma verdadeira metamorfose numa lenta decadência transformadora nos gostos refinados tradicionais onde se evaporam os intensos prazeres tradicionais percepcionados pelas papilas gustativas, com os consumidores a mudarem apressadamente os seus comportamentos. Com isso, os mercados transformam-se com o comércio a tentar adaptar-se aos novos conceitos, criando novas modas.
A enorme entrada de estrangeiros com diferentes nacionalidades constitui cerca de dez por cento da população, percentagem que aumenta com a vinda de turistas, gerando uma força motora irreversível nos comportamentos alimentícios e nas vidas sociais, onde os sentidos tradicionais dos gostos e aromas se transformam lentamente.
As misturas das raças envolvem sangue novo que pode ser positivo na parte laboral como nos novos aspectos sociais, gerando múltiplas mudanças gastronómicas que se iniciaram com as pizarias, depois com os “fast food” e em seguida com os restaurantes chineses e outros.
As pizarias trouxeram gostos mediterrânicos e os chineses realçaram os sabores agro-doces agradáveis, mas diferentes dos nossos. Assim, há que harmonizar os vinhos com estes novos sabores e habituar-nos às exóticas infusões ou aguardentes brancas chinesas, agradáveis, mas, sem dúvida, diferentes com a sua origem no arroz.
Os vinhos portugueses, julgados dos melhores do mundo, devem valorizar-se culturalmente, educando os novos residentes nas suas ligações sensoriais, devendo tornar os vinhos mais leves e integrá-los nos gostos asiáticos, já que esta nova tipologia de consumidores deve ser culturalmente preparada para os nossos comportamentos mediterrânicos.
O vinho representa o símbolo da bebida nacional dos portugueses e dos mediterrânicos, devido à sua tradição na história bíblica, o que está em oposição ao que observamos quando visitamos os “fast food” dos centros comerciais e observamos os litros de refrigerantes que se consomem e são dieteticamente desaconselhados. Deveríamos ponderar a tipologia das temáticas das vendas que actualmente estão em vigor, incluindo aqueles que, por tradição, são mais requintados, e reparamos que os restaurantes não estão adaptados aos novos contextos.
O vinho, antes de tudo, pela sua história, é um produto cultural e acho que Portugal se esqueceu deste detalhe, seja na formação das escolas de restauração e hotelaria, como nos pragmatismos das vendas, revelando uma completa e evidente ausência pedagógica nos gostos e nos aromas.
A função dos escanções pode influenciar culturalmente os consumidores, conduzindo-os como um guia nas novas experiências gastronómicas numa comunhão entre os alimentos e os vinhos. No meu entender, não é suficiente saborear a bebida faltando ouvir a sua história, a sua vida, para animar os repastos, enriquecendo culturalmente os convívios.
Outro esquecimento tem a ver com as águas que se bebem, sejam minerais ou outras, com uma ausência quase total do “hidro sommelier” ou escanção das águas. É necessário saber realizar com competência os rituais do escanção que podem sugerir inspirados na experiência. Acompanhar os vinhos e as águas e realizar verbalmente a arte das ligações na refeição exige que sejam avaliados os níveis gastronómicos qualitativos e casá-los em harmonia, respeitando os justos sabores que requerem criatividade sensorial.
Como imaginar a qualidade de vida com beleza e criatividade na vida dos seres humanos num mundo onde o conforto, o dinheiro e o materialismo parecem tornar-se implacavelmente importantes? Talvez possamos encontrar uma boa resposta no clássico pensamento de Epicuro, onde os prazeres deviam ser simples e ligados com poesia à natureza e aos sentimentos das amizades.