A argumentação apresentada pelo juiz Ivo Rosa para não pronunciar José Sócrates pelos crimes de fraude fiscal de que estava acusado o ex-primeiro-ministro «é errada». É essa a opinião de vários fiscalistas por nós contactados nos últimos dias após ser conhecida a decisão de Ivo Rosa, no âmbito da Operação Marquês, que escandalizou o país.
Entre as várias afirmações, na tarde de sexta-feira, que foram deixando estupefactos muitos dos que assistiam à leitura da decisão instrutória está a que se refere aos crimes fiscais. Disse Ivo Rosa que «inexiste qualquer norma legal no nosso ordenamento jurídico que imponha a um cidadão a obrigação de declarar, em sede de IRS, os proventos obtidos com o cometimento de um crime». Ora, como nos referiram especialistas em direito fiscal, tal é «errado». O artigo 10.º da Lei Geral Tributária refere-se concretamente à tributação de rendimentos ou actos ilícitos. Dizer que esses rendimentos ilícitos (uma vez que o juiz Ivo Rosa assumiu que não se tratava de empréstimos de Santos Silva) não se enquadram em nenhuma categoria é igualmente errado pois o Código do IRS - artigo 9.º alínea d - prevê a inclusão dos “Acréscimos patrimoniais não justificados” em que aparentemente se enquadram os milhões de euros que José Sócrates terá recebido indevidamente.
A criminalização desta fuga fiscal poderá, segundo os mesmos especialistas, ter mais de uma análise técnico-jurídica mas como se está perante uma decisão instrutória - em que apenas se deve analisar se há indícios que justifiquem a ida a julgamento - Sócrates deveria ter sido pronunciado pelos crimes e caberia depois ao colectivo de juízes tomar a decisão em sede de julgamento. Além da parte criminal, a tributação destes rendimentos terá de ser feita pois não se encontra prescrita havendo quem defenda que Ivo Rosa deveria ter desencadeado os mecanismos para que a Autoridade Fiscal iniciasse o processo de cobrança.