Jornal defensor da valorização de Aveiro e da Região das Beiras
Fundador: 
Adriano Lucas (1925-2011)
Diretor: 
Adriano Callé Lucas

“Nem todas as empresas vão ter capacidade de se reerguer”


Sexta, 24 de Abril de 2020

Que análise faz da situação que se vive actualmente?
Vive-se uma situação sem precedentes, não só na região Centro, mas no resto do país, da Europa e do Mundo. Esta pandemia de Covid-19 veio mostrar que somos mais vulneráveis do que pensávamos. Ainda assim, registamos que os números da expressão da doença não são tão gravosos entre nós como se chegou a recear. O país reagiu de forma rápida, as forças vivas juntaram esforços, os portugueses perceberam a importância de ficar em casa e, em consequência, não estamos numa situação tão aflitiva como outros. Estamos no bom caminho. Há perdas de vidas a lamentar, a economia foi severamente atingida, mas há razões para encarar o futuro com algum optimismo.
 
Qual o impacto no turismo?
O impacto no turismo é avassalador. O confinamento das pessoas em casa e o fecho das fronteiras provocou, na prática, a suspensão de toda a actividade turística. São milhares de empresas que, de um momento para o outro, perderam todas as receitas, com consequências gravíssimas ao nível do emprego. É de salientar que a região Centro de Portugal tem mais de 17% da sua mão-
-de-obra activa associada à actividade turística. Temos a consciência de que nem todas as empresas vão ser capazes de ultrapassar esta situação, mas sabemos também que a resiliência é uma característica dos empresários da região.
 
Conhecidas que são as diversidades que tornam úni­ca a região Centro, as consequências são iguais para toda a região?
De um modo geral, esta é uma situação que afecta toda a região. A actividade turística funciona em cadeia. Quando há dificuldades a montante, elas são imediatamente sentidas a jusante. Os visitantes espanhóis são, a par dos nacionais, o principal mercado emissor para todas as sub-regiões do Centro de Portugal. A partir do momento em que esse mercado deixa de emitir, pelo fecho da fronteira, todas as sub-regiões são afectadas. Acresce que a actividade turística no Centro de Portugal se caracteriza, na esmagadora maioria, por ser realizada por microempresas e empresas familiares, que muitas vezes não têm arcaboiço financeiro para aguentar uma paragem da actividade.
 
As medidas aprovadas pelo Governo são suficientes nes­te curto prazo?
As medidas são manifestamente insuficientes, como os empresários têm vindo a alertar todos os dias. Muitas das medidas que foram apresentadas para fazer face à suspensão da actividade turística assentam em soluções de crédito. Acontece que o endividamento não é solução para a maioria das empresas, que neste momento não têm liquidez para poderem suportar os próximos meses. Sem perspectivas de receitas, as empresas têm natural receio em endividarem-se, por muito baixo que sejam as taxas de juro.
 

O que considera que devia ser feito?
Por um lado, no caso das medidas de crédito anunciadas, o dinheiro tarda em chegar às empresas. É algo que urge ser resolvido. Mas para se poder salvar mais empresas, serão necessárias injecções directas de capital – algo que, aliás, está a ser praticado noutros países europeus. Ao salvarmos empresas, estamos a salvar emprego, o que é verdadeiramente fundamental para fixar habitantes em territórios de baixa densidade, como é a maioria do território do Centro de Portugal. A actividade turística tem, nesta região, a particularidade de ser, em muitos casos, o principal vector de fixação de habitantes. Há vastos territórios que praticamente dependem do turismo para assegurar empregos e sem empregos não há pessoas. Ao salvarmos empresas, estamos a salvar a região.
 
A Turismo do Centro lançou uma campanha de esperança. Quais são os objectivos?
A campanha “Haverá Tempo”, que lançámos logo no início da crise, é uma campanha de esperança e com uma mensagem positiva: a de que haverá vida depois da pandemia e que voltaremos todos a encontrarmo-nos no Centro de Portugal após o Covid-19. É uma campanha que realça a vontade que todos temos de voltarmos a viajar, de voltarmos a usufruir da liberdade de descobrir, ou redescobrir, um território tão vasto e diversificado como é o nosso. O Centro de Portugal não mudou e está à espera de todos, assim que seja possível sair de casa e voltar a viajar. Estamos também já a preparar uma nova campanha, direccionada para os meses de Verão, em que queremos que os nossos concidadãos portugueses venham à região.
 
De que forma a região se pode preparar para o pós-
-pandemia?
Sabemos que viajar vai ser uma experiência diferente nos próximos tempos. Nas motivações das pessoas, a percepção de saúde e de segurança vão ser muito mais determinantes. Por isso, temos a convicção de que destinos menos massificados e mais associados à experiência do turismo ao ar livre, na natureza, em que a distância social sempre existiu, podem estar na primeira linha das escolhas. Os destinos que podem oferecer estas características estarão, seguramente, na primeira preferência dos portugueses. Nesse aspecto, o Centro de Portugal será uma escolha evidente. A região deve assumir-se como destino preferencial para quem procura um território seguro, saudável e tranquilo para visitar ou descansar.
 
E que desafios se colocam?  
As empresas da actividade turística vão ter de se reinventar e adaptar a estas novas exigências que decorrerem da pandemia. Nada voltará a ser como dantes. É fundamental que as empresas pensem em estratégias para o pós-Covid-19, nas quais aliem a percepção de a região ser um destino de qualidade, seguro e saudável a uma presença cada vez mais forte, profissional e criativa nas plataformas digitais. Os dias que estamos a viver comprovam que a digitalização da economia é um dado adquirido e um caminho sem retorno. As pessoas estão em casa, em frente a um monitor, que é a sua janela para o mundo – empresas que não estejam nesta janela, terão poucas hipóteses de sobreviver.

Acredita que todas as empresas ligadas aos vários sectores do turismo nesta região terão capacidade de recomeçar?
Sabemos que isso não irá acontecer, infelizmente. Os dados de que dispomos indicam que no caso da restauração, por exemplo, cerca de sete a 10 por cento das unidades estão a ponderar não reabrir. É um número muito significativo.
 
Que ensinamentos se podem retirar desta situação que vivemos?
Esta pandemia revelou a importância de a sociedade estar precavida para fazer face a uma crise que tem uma escala planetária, como esta. Há muito a fazer, nomeadamente na construção de mecanismos de solidariedade entre países. Esta crise global precisa de uma resposta global. Nenhum país tem capacidade para aguentar este impacto sozinho, como se está a comprovar.


 Como vê o futuro?
O turismo vai mudar com esta pandemia. O comportamento dos turistas será diferente e as empresas do sector terão de saber adaptar-se a esta nova realidade. A nível regional, acreditamos que a partir de Junho ou Julho começará a assistir-se ao início de uma retoma. Esta será ténue, inicialmente, mas paulatinamente as pessoas vão recomeçar a viajar - até porque viajar, conhecer novos sítios ou regressar àqueles onde nos sentimos felizes, não é apenas um capricho, mas uma necessidade real, de forma a podermos recarregar as baterias depois de um período tão difícil. Numa segunda fase, a partir do final do ano, acreditamos que iremos registar o regresso progressivo de estrangeiros à região. 


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