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“Povo é o grande culpado da forma grotesca como o vírus atingiu Itália”


Sábado, 18 de Abril de 2020

Nuno Lopes vive hoje, e há várias semanas, «literalmente fechado em casa» num condomínio na Lombardia, em Milão, a zona mais atingida pela pandemia da Covid-19, em Itália. Barman num hotel de Milão, este jovem de 28 anos, natural de Pombal, só sai para fazer compras e tenta fazê-lo o mais espaçado no tempo possível e sempre com todos os cuidados para se proteger «ao máximo». Até porque, em casa, tem mulher e um filho muito pequenino.
Há uns tempos, ainda tentava dar um passeio, com ambos, perto da residência, mas neste momento fica-se por casa e, no máximo, pelo terraço, onde apanha «ar e sol, quando há». É de lá que assiste, preocupado, à tragédia que vive o povo italiano, até agora um dos mais atingidos por este “tsunami” mundial, tanto em número de infecções, como de mortes, fazendo com que tenha colapsado por completo todo o sistema de saúde e obrigando os médicos a decidir quem morre e quem se salva, por não haver capacidade de resposta para todos.
«Muita gente morre porque não tem oportunidade ser tratada e, de facto, os médicos têm de escolher quem tratar, consoante as hipóteses de sobrevivência e perspectiva de vida», lamenta Nuno Lopes, falando em «hospitais completamente lotados», nomeadamente em zonas como a Lombardia e Emilia Romanga e do envio, «todos os dias, de doentes para outras regiões de Itália menos afectadas e para a Alemanha».
Felizmente, na sua família estão todos a salvo, mas o português - que estudou Engenharia Mecânica, em Coimbra, mas depois optou por se dedicar à sua paixão, ser barman – conhece pessoas «que tiveram de passar por hospitais e que perderam familiares» nesta pandemia e, garante, «os testemunhos são horríveis e muito tristes». «É, de facto, uma calamidade muito grande o que tem acontecido nos hospitais por aqui», comenta, prestando homenagem a todos quantos estão «na linha da frente» desta luta, «a ver pessoas morrer todos os dias e a não conseguir tratá-los como deviam». «Acredito que os marcará para o resto da vida», diz.
Nuno Lopes não tem dúvidas de que o grande responsável pela tragédia que se vive em Itália é o povo italiano. É certo que «o Governo e todas as pessoas foram apanhadas desprevenidas», apesar do que já se sabia sobre o vírus na China, mas que os responsáveis políticos do país «actuaram como deviam», fechando 12 cidades italianas, assim como escolas, universidades, cinemas e teatros na Lombardia, «ao segundo dia do surto, com cerca de 150 casos confirmados».
«A população é a grande culpada pela forma grotesca como este vírus atingiu a Itália. Desde o primeiro dia, a maior parte das pessoas desvalorizou o assunto e continuou a fazer a sua vida normal. À medida que iam fechando postos de trabalho, as pessoas aproveitavam para ir de férias ou passear», critica, sublinhando que chegou a haver «movimentos em Milão a pedir ao Governo para continuar a fazer movimentar a cidade e para não fazer parar a economia».
«Eu acompanhava o desenrolar da situação na China desde o início e já tinha falado com alguns colegas que se isto acontecesse cá, ia acontecer o mesmo e tínhamos de nos fechar em casa. Muitos chamaram-me alguns nomes menos próprios de dizer aqui, mas a verdade é que o hotel onde trabalho acabou por fechar duas semanas depois do início do surto», conta Nuno Lopes.
Hoje, as pessoas já pensam diferente: «sentem medo e vivem angustiadas por tudo o que se vê na televisão», diz. «Na minha opinião, acho que o Governo tinha fechado tudo desde o primeiro minuto em toda a Itália, se pudessem voltar atrás, mas depois de ver tudo o que tem acontecido, é fácil falar», confirma, falando num país que, agora sim, está «parado» e onde, apesar de tudo, se «começa a ver uma luzinha ao fundo do túnel», embora o «caminho ainda seja longo».|


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