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Se antes era uma cidade com vida, agora é no silêncio que (sobre)vive


Quinta, 19 de Março de 2020

Pandemia O mercado municipal tinha ontem bancas fechadas, via-se pouco movimento nas ruas de Coimbra, o comércio fechou portas e faziam-se filas na farmácia para garantir o essencial. O receio de não saber o dia de amanhã, esse permanece

Quem a viu e quem a vê. A cidade está com outra imagem, é certo. E o coração de Coimbra traduz o receio e preocupações que se têm vivido. A circulação de automóveis não é a mesma. E as poucas pessoas que caminham têm um motivo maior: ou vão ao mercado à procura dos bens alimentares ou fazem filas na farmácia para que o essencial não lhes falte. Sobram lugares nas paragens dos autocarros. E o comércio fechou portas. Este era ontem de manhã o retrato de uma cidade que, ainda há pouco tempo, se fazia ouvir. Agora, o silêncio predomina e esta situação irá acentuar-se, face ao Estado de Emergência ontem decretado.

No Mercado Municipal D. Pedro V não há memória da falta de sabores e cores. Agora, há bancas tapadas, umas com avisos de “Quarentena Voluntária” e outras porque «já não há produto». Emília Silva, de 55 anos, vê aquele mercado como segunda casa há «perto de 20 anos». Tem aguentado a “barraca”, mas já só leva aquilo que sabe que os clientes lhe vão comprar. «Tenho cinco estufas cheias de tomate e pimento que já foram plantados em Janeiro e Fevereiro. A despesa já está feita. Cada tabuleiro de tomate daquilo que plantamos custa 40 euros», disse, acrescentando que no dia em que deixar de ter clientes também já não se justifica a sua presença ali.
Ir ao mercado sempre fez parte da rotina e, para Graça Mendes, que se considera «cliente habitual», ontem a sua ida não foi excepção. «Já estava a ficar sem nada. Tive de vir mesmo porque não sabemos o que nos vai acontecer», contou Graça Mendes que, segundo recorda, nunca antes tinha visto bancas vazias e algumas “encerradas”. Carne, peixe, batatas e legumes encheram o saco e tudo «para que não tenha de regressar mais vezes».
A viagem continuou. A banca de venda de jornais, perto do mercado e junto aos antigos Correios, está nas mãos de Paulo Ferreira. Os jornais nacionais e revistas, esses permaneciam em cima do balcão. «Tenho feito apenas 5% do habitual. Não se está a vender. Em 32 anos aqui, nunca vi nada assim», contou.
A Praça 8 de Maio, a Rua Visconde da Luz e a Rua Ferreira Borges deixaram de ser palco da maior afluência de pessoas. O comércio, ou grande parte dele, mantém-se fechado, os avisos nas portas de «encerramento indeterminado» ganham destaque nas montras.
As farmácias são dos poucos estabelecimentos que se mantêm em serviço para que nada falta a quem mais precisa. E as filas, de forma a manter a distância de segurança, não passam despercebidas. Francesco Annunziata, de bicicleta, juntou-se à fila para a farmácia. Tem 22 anos, é italiano e, contou, já era a quinta farmácia que percorria à procura de máscaras. Está em Coimbra, desde Setembro, a cumprir o programa de Erasmus no curso de Línguas Modernas na Faculdade de Letras. Voltar para o seu país de origem, quanto mais não fosse para viver este momento com a família, já não lhe é possível e, confessa, perante tal situação, regressar já não faria parte dos seus planos. «Estou preocupado com a minha família e eles comigo mas agora temos de ter calma», diz, estando certo de que «o que Portugal fez de mais inteligente foi prevenir e fechar tudo o mais rápido possível».


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